A violência do racismo é tão profunda em nossa sociedade, e de efeito tão extremo sobre os que a sofrem, que sim, exige cuidado, conhecimento e empatia para qualquer trato sobre o tema. Em vídeo produzido para o projeto Criança Esperança, a Rede Globo mostrou precisamente o que não fazer.
No vídeo, um ator branco convida uma série de crianças negras para lerem frases de cunho racista para uma atriz adulta e também negra. Diversos projetos de natureza semelhante já foram realizados pelo mundo, mas raramente de forma tão indutiva, apelativa e até mesmo cruel quanto esse.
No afã de transformar tudo em novela, a emissora utilizou um formato potencialmente interessante, e transformou não só em um mero produto, mas um produto que peca pelo excesso de demagogia e por expor aquelas crianças, não em uma experiência reflexiva, mas sim a vivenciarem o racismo de fato e simplesmente.
Concretamente as crianças leram frases que a maioria já havia ouvido. Seus sofrimentos eangústias tornam-se reais, espetacularizando e mercantilizando o efeito do racismo de verdade.
No lugar de expor os agressores, de mostrar a construção de um discurso ou pensamento racista, ou de uma sociedade adoecida como um todo, o vídeo acaba por fim expondo simplesmente a emoção e dor daquelas crianças, a fim de emocionar o expectador em casa. Se convidassem representantes da comunidade negra para pensar a experiência, certamente o resultado teria sido diferente.
O vídeo parece nos conduzir não a uma reflexão transformadora, e sim a uma emoção um tanto esvaziada e pueril, como uma cena de novela.
O racismo é mesmo algo terrível. Mas como ele se constrói? Qual sua história? Como os próprios meios de comunicação o propagam? Como podemos de fato combate-lo? O convite a esse tipo de reflexão (e, no caso da Rede Globo, auto-crítica) talvez pudesse de fato trazer às crianças alguma esperança.